segunda-feira, 10 de março de 2014

Crítica – Flight – 2012 – Robert Zemeckis

Algo me diz que «Flight» não será lembrado por muito tempo.

Não é que o filme não seja bom: é MUITO bom até. Mas enquanto o tema da auto-aceitação e redenção é particularmente comovente, o mesmo já não pode ser dito do «embrulho» em que é entregue.

Por exemplo, «American History X» e «The Wrestler», de uma forma ou doutra são filmes que tratam do mesmo assunto: os vícios apaixonantes que corrompem o espirito humano e o deixam apodrecido na berma da estrada. «Flight» é parecido com ambos em vários aspectos (grande performance central, personagens secundárias coloridamente desenvolvidas, detalhes de realização impecáveis…), menos na maneira como nos faz sentir «encaixados» com a personagem principal e as suas decisões: é complicado simpatizar com um bandalho.



Whip Whitaker (Denzel Washington) está brutalmente bêbado, drogado e vai pilotar um avião cheio de passageiros. Quase chegando ao destino, uma avaria ocorre, levando Whip a seguir os seus instintos (completamente «cocaínados») e a tentar uma manobra inédita no mundo da aviação. A maior parte dos passageiros sobrevive e o piloto é aclamado como herói nacional: isto até surgirem análises ao sangue feitas logo após o acidente...

E adivinha: os pilantras da inspecção não querem saber se pilotas aviões com colesterol alto! Já ninguém zela pelo bem-estar das pessoas hoje em dia…

Robert Zemeckis (Back to the Future, Forrest Gump) regressa às películas «de carne e osso» depois de 12 anos a «brincar» com imagens animadas (Beowulf e Polar Express são exemplos).

Bem, parece que «quem sabe, não esquece» e «Flight» é mais um marco na carreira de um realizador que continua a amadurecer. É um retrato humano poderoso, construído com consciência e «evocando» a reação desejada do público: no entanto não poderia estar mais longe da sensação de alegria de viver exaltada em «Forrest Gump».

A felicidade aqui surge apenas de forma artificial.

O voo (peça fulcral do filme e um exemplo de execução cinematográfica perfeita, combinando desenvolvimento de personagem, efeitos especiais de cortar a respiração, representação de topo, realização e cinematografia prodigiosos, diálogo inspirado,…) mimica a espiral descendente e ascendente das duas personagens principais.

Washington é fantástico, oferecendo-nos acesso livre à alma deste homem torturado pelas próprias escolhas.

«Eu tenho uma ex-mulher e um filho com quem nunca falo! E sabes porquê? Porque eu escolho beber!»

E controla-se: o seu controlo é tão evidente que Zemeckis afasta a câmara, aumentando o suspense e a tensão. Existe um momento claro no filme em que a implosão ocorre de uma maneira tão absolutamente brutal que chega a tornar-se comédia negra.

Se esse registo se mantivesse estaria a olhar para «Flight» de maneira diferente. Mas o final é mais humano do que alguma vez poderia ter esperado. Ou então não: afinal de contas este ainda é um filme do gajo que pôs o Marty McFly a salvar o pai do Biff, não é?



O meu problema com o filme, é que não nos afeiçoa de maneira nenhuma ao protagonista: ele é pura escumalha e orgulha-se disso! Como é que é suposto rejubilarmos quando ele faz algo de bem, ou sentirmos pena quando faz algo de péssimo?

Mais: as personagens da drogada e do filho parecem estereótipos dos grupos sociais a que pertencem… 

Para mim, simplesmente não funcionaram.

E falando nela, Kelly Reilly é-nos mostrada a ter uma overdose ao mesmo tempo que o avião se despenha… Não seria mais interessante que esta conexão se continuasse a verificar ao longo da história?

São estas pontas soltas que ficam pouco esclarecidas e baixam a magnificência que nos é apresentada.


Contando com John Goodman (hilariantemente instável), Don Cheadle (inteligente e infatigável) e uma banda sonora que nos leva gloriosamente de volta aos anos 70, sem dúvida que Simon Says that this movie is …



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